quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A LAMPARINA E O LAMBARI

Durante vários anos andei pelo interior, pesquisando lendas para a publicação de um livro. Nas minha andanças tive contato com os tipos mais estranhos, que diziam ter visto assombrações, outros conheciam encantos milagrosos e outros, ainda, eram mais encantadores por serem típicos e engraçados: os mentirosos.
Lá no Corre-Água, próximo ao distrito de São Joaquim do Pacuí moram Seu Francisco e Seu Jarbas, vizinhos e compadres, que na cata de coisa melhor para fazer, contam lorotas um para o outro. E o pior é que juram pela saúde dos filhos e pelo amor da mãe, que trata-se da mais pura verdade.
Um certo dia a disputa por quem aplicava uma lorota de bom tamanho terminou empatada. Seu Francisco contou a Jarbas que na noite anterior foi até o rio Corre-Água, pescar. Antes, na falta de óleo para sua lamparina, retirou um pouco de banha de traíra e experimentou acender o pavio. E não é que a coisa funcionou? Mas esse, afinal, ainda não era o melhor da história. Eis que quando tentava fisgar um jeju, atrapalhou-se e jogou a lamparina no rio. A bicha afundou, afundou... mas vejam só, já que o óleo era de peixe, que por sua vez vive na água, a lamparina não apagou. “Está lá para quem quiser ver”, concluiu seu Francisco, dando uma pitada no cigarro de palha.
Seu Jarbas não questionou. Tecendo seu próprio cigarrinho, disse acreditar piamente na história, mas também resolveu contar um fato estranho que lhe havia acontecido dias antes. Estava ele no mesmo rio, tentando apanhar um pirarucu de mais de metro que havia percebido ali dias antes. Estava com o arpão em punho, esperando o peixão vir à tona para respirar. De repente percebeu o movimento do peixe e arpoou. Acertou em cheio, mas qual sua surpresa? O bicho que brigava com o arpão não era um pirarucu. Era um lambari. Mas não era apenas um lambari. Era um “senhor lambari”, com quase um metro de tamanho e pesando mais de cem quilos. E o danado tanto brigou que conseguiu fugir do arpão quando já estava quase apanhado.
- Mas um lambari, compadre Jarbas? Todo mundo sabe que o lambari é do tamanho de uma sardinha...
- Pois é, compadre, não sei porque cargas d’água este era enorme, grande mesmo. Juro pela memória da minha mãe, já falecida, que Deus a tenha.
Terminando a conversa os dois compadres se despediram e foram dormir. Já era madrugada quando Seu Francisco bateu à porta de Seu Jarbas. Este atendeu, ainda sonolento e recebendo de pronto a proposta do vizinho e compadre:
- Olha, Seu Jarbas, eu não consigo dormir, portanto vamos fazer o seguinte: o senhor diminui o tamanho do seu lambari, que eu apago a minha lamparina.

Joseli Dias
Do livro o Conto do Vigário

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